A importância da assinatura ou Como Danny Boyle voltou a ser Danny Boyle

Em Transe tem muitos aspectos mal resolvidos. A direção de Danny Boyle certamente não é um deles.


Quem quer ser um milionário? foi um grande engodo que conseguiu agradar a Academia faturando oito estatuetas do Oscar. Já 127 horas é um filme regular de direção firme, mas que se perde em meio a banalidade de sua própria trama (mais uma história de sobrevivência...). O diretor Danny Boyle, inventivo e frenético em Trainspotting, Cova Rasa e Extermínio, aparentemente se rendeu a caminhos mais palatáveis. Em Transe é um considerável desvio nos rumos atuais de sua carreira, no entanto, um desvio que o leva a seu lugar de origem e nos faz ver quão importante é para um diretor manter sua assinatura. Não tornar-se imutável, mas preservar as suas marcas, o aspecto autoral de seus filmes.

Em Transe conta a história de um homem que trabalha em leilões de obras de arte. Durante uma ação de criminosos para roubar uma das peças em oferta, esse funcionário é atingido na cabeça e perde toda a sua memória recente. Com o intuito recobrar a lembrança dos eventos que aconteceram durante a ação criminosa, ele passa a se submeter a sessões de hipnose conduzidas por uma terapeuta especialista na técnica. Contar mais do que isso seria estragar várias surpresas essenciais para o entretenimento do próprio leitor. Surpresas que são importantes (acreditem, céticos!) pois Em Transe é o tipo de filme que foi concebido com o intuito de desvendar acontecimentos para seus personagens e para o público concomitantemente.

Nessa trama que flerta com A Origem e (acreditem!) Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, Danny Boyle volta ao tom lisérgico de um thriller envolvente e ambicioso. Não há dúvidas de que sua direção é eficiente pois consegue manter os olhos e a mente do espectador em constante tensão e atividade. No entanto, o roteiro escrito pela dupla John Hodge e Joe Ahearne não acompanha a sofisticação visual, rítmica e por vezes emocional do filme. Os personagens de Em Transe são unidimensionais e simplificados em suas motivações pelas funções que exercem na trama e em suas próprias vidas (a terapeuta, o criminoso e o anti-herói), até mesmo o sentimento que passam a nutrir uns pelos outros é simplificado pelo script. Para se ter uma ideia do tropeço, uma das personagens que mais sofre com a superficialidade no tratamento é o eixo de toda a trama.

Apesar da displicência do roteiro, o trio de atores central se esforça, diga-se de passagem, outro aspecto que nos leva a Danny Boyle. James McAvoy mais uma vez incorpora como  poucos um carismático anti-herói cheio de nuances interessantes e Vincent Cassel cumpre bem a sua função na trama, seu personagem tem um curioso twist que "brinca" com toda e qualquer sorte de expectativas a seu respeito. Já Rosario Dawson é inegavelmente a grande estrela do longa, uma mescla de musa policial e heroína resignada muito bem sucedida - há anos a moça merecia uma chance como essa. Tudo é claro, sem muito esforço do roteiro. Os bons desempenhos dos atores vêm das orientações de Boyle e do esforço de cada um deles.

Em Transe pode não ser o melhor exemplar da carreira de Danny Boyle, soando como um filme superficial na psicologia de seus personagens, quando na verdade pressupõe-se que teria que aprofundar-se nas motivações e nos conflitos éticos de cada um. O que torna o filme uma experiência no mínimo interessante é o conjunto de esforços entre direção e atores que consegue torná-lo um projeto válido apesar de todas as falhas.



Trance, 2013. Dir.: Danny Boyle. Roteiro: John Hodge e Joe Ahearne. Elenco: James McAvoy, Rosario Dawson, Vincent Cassel, Danny Sapani, Tuppence Middleton, Matt Cross, Wahab Sheikh, Mark Poltimore, Simon Kunz, Vincent Montuel. 101 min. Fox.

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Chovendo Sapos: A importância da assinatura ou Como Danny Boyle voltou a ser Danny Boyle
A importância da assinatura ou Como Danny Boyle voltou a ser Danny Boyle
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